terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Ninguém escreve ao coveiro




               

                  




                   Quem é que define quem será o que nessa vida? Alguém precisa enterrar os mortos. José era o coveiro, era dele esse encargo.

Naquela cidade todos o conheciam. Também muitos escrevem cartas, mas ninguém escreve ao José. Ele é o coveiro, por que alguém escreveria para ele?

Lançou a última pá de terra daquele dia. Cruzou o portão que separa o cemitério da grande avenida, e andou até o ponto de ônibus. Minutos depois, abria a porta de sua casa, quando, então, teve um sobressalto. Havia no chão um envelope, era uma carta.

Observou que não havia remetente. Largou-a no canto da mesa. José era um cara metódico. Leria na sexta-feira, quando retornasse da festa de aniversário de seu amigo. Metódico que é, não deixaria uma carta inesperada atrapalhar seus planos.

Era apenas quarta-feira. José, com seu jeito taciturno, tocava seu trabalho. Um funeral não é uma festa, ele tinha se acostumado a manter a feição casmurra.

Nenhum dia é tão distante que logo não chegue. E a sexta-feira chegou. José foi à festa, nada mudaria seus planos, afinal, ele é um homem metódico. Por volta das 10 horas da noite, a festa acabou. Justamente naquele dia, resolveu entrar numa balada, que não estava em seus planos.

Pouco passava da meia-noite, olhou à direita, mas não olhou à esquerda, e se projetou pela rua. Um cantar de pneus, seguido de um grito.

Uma vizinha, entre as pessoas que velavam seu corpo, notou que havia um envelope ainda lacrado. “Não seria melhor alguém abrir”, disse. Foi o que fizeram. Nele estava escrito:

“Sexta-feira volte para casa antes da meia-noite”. A morte.

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