Já havia feito de tudo um pouco em sua vida. Um desejo latente pairava abandonado nas entrelinhas de seu passado. Nos últimos dias, uma ideia fixa começava a inquietá-lo. O sonho de aprender a arte de escrever retornava agora com mais intensidade. Como se o vento daqueles dias tivesse varrido a poeira acumulada sobre a agenda de seus sonhos. Sentiu que o momento havia chegado. Então, decidiu olhar para frente e atender ao descompasso de seu coração.
Caminhos bifurcados adiante. Por onde deveria começar. Cheio de esperanças e dúvidas adormeceu naquela noite.
Era o amanhecer, caminhava por entre a relva ainda molhada. Logo em sua frente, uma casa, tudo nela tinha a coloração sépia, contrastando com o verde floresta daquela miragem. Um senhor de cabelos grisalhos e barba longa estava sentado à entrada. Ao se aproximar, esse senhor rompeu o silêncio. Mandou que chegasse, já o esperava. “Então você busca o fio condutor para ser um contador de histórias? Vou-lhe adiantando, não tenho essa resposta, essa resposta está em você. Não escreva para agradar as pessoas, escreva para derrubar mitos, tabus, preconceitos, inclusive os seus. Seja um provocador. Lembre-se, enquanto o medo for maior que a vontade de fazer, continuará vagando infinitamente nessa trilha. E agora, siga”, finalizou.
Retomou a trilha e seguiu em frente. Guardou cada palavra do grande mestre. Precisava manter o controle, mas seu coração começou a pulsar mais forte. Logo adiante, como se a casa fosse uma réplica e estivesse andando em círculos, lá estava o senhor de barbas longas. “Busque a essência para fugir do vazio, da superficialidade. Nada que importa está ao alcance dos olhos, tente olhar com o coração”. Parou por um instante, como a dar tempo para que o aprendiz meditasse sobre as palavras que foram largadas ao vento. “Olhe para o céu numa noite de lua cheia”, continuou. “O brilho e o tamanho da lua fazem supor que ela é a gigante do firmamento. No entanto, é centena de vezes menor do que a estrela mais próxima. Tudo depende da perspectiva, do ponto de vista daquele que vê. É preciso desenvolver a capacidade de transportar-se mentalmente para outro lugar. Poderá ter surpresas e encontrará outras verdades. Não somente contará histórias, mas viverá outras vidas”. Fez agora uma longa pausa, entreolharam-se por um instante. “Siga em frente”, disse, se retirando.
Enquanto prosseguia na trilha, decifrava a metáfora do segundo mestre. Uma suave luz no horizonte já começava a surgir. Um possível sinal a dizer que era capaz. Já não foi mais surpresa quando viu uma casa muito semelhante às outras. “Para atingir os homens é preciso observar os pássaros. Escreva com a leveza de seu voar. Não espere ficar pronto. Pronto está aquele que abdicou de aprender”. Isso foi tudo o que o terceiro mestre falou.
Seus olhos se abriram, uma pequena fenda em sua janela deixava ver que o dia havia amanhecido. Tomou um lápis e começou: “Era uma vez um jovem que queria ser escritor...”
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